O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei que institui a Política Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental. A medida, publicada no Diário Oficial da União nesta segunda-feira 26, integra ao Sistema Único de Saúde (SUS) o atendimento especializado a famílias que enfrentam a perda de um filho durante a gestação, no parto ou nos primeiros dias de vida.
A proposta é de autoria do atual ministro da Saúde, Alexandre Padilha, elaborada em 2019 durante seu mandato como deputado federal. “Em 2019, construímos um projeto de lei que foi fruto do diálogo com várias mulheres. Essa política define o que as maternidades precisam ter para cuidar daquelas mães e pais que perdem os filhos antes ou após o parto”, afirmou o ministro.
Com a nova lei, o SUS deverá ofertar apoio psicológico especializado, exames para investigação das causas da morte, acompanhamento de gestações futuras, protocolos clínicos e espaços reservados para acolhimento de pessoas enlutadas.
Além disso, a norma altera a Lei de Registros Públicos para permitir que natimortos sejam oficialmente registrados com o nome planejado pelos pais. Antes, as certidões continham apenas dados técnicos, como sexo, data, local e filiação.
Segundo Padilha, “nós sabemos que o luto materno e parental é uma dor silenciosa, mas que grita no coração das famílias. O Ministério da Saúde está do lado dessas pessoas para acolher, respeitar e humanizar essa perda”.
Atualmente, apenas três hospitais no país oferecem atendimento especializado ao luto parental: o Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB), o Hospital Materno de Ribeirão Preto (SP) e a Maternidade de Alta Complexidade do Maranhão (PI).
Entre 2020 e 2023, o Brasil registrou 172.257 óbitos fetais. A região Sudeste teve o maior número de casos, com 40.840 natimortos. Em 2024, dados preliminares do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) apontam 22.919 óbitos fetais e 19.997 óbitos neonatais.
O Ministério da Saúde articula com universidades públicas e instituições parceiras a construção de diretrizes participativas. A pasta também atualiza ações existentes para incluir o tratamento ao luto gestacional, neonatal e infantil.
O ambulatório de luto parental do HMIB, criado em 2013, oferece suporte terapêutico e tratamento para transtornos mentais decorrentes da perda. Com média de 50 atendimentos mensais, o serviço é integrado à equipe de Cuidados Paliativos Perinatais e Pediátricos, com atuação de psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais.
“A gente não tem o poder de curar o luto de ninguém. O que a gente faz é dar a mão e caminhar junto”, disse a médica psiquiatra Maria Marta Freire, responsável pelo ambulatório. Para ela, a ausência de espaços adequados para o momento da despedida aumenta o risco de depressão. “O momento da despedida é muito importante no processo de luto. Às vezes, a mãe não consegue ver o bebê logo após o parto, mas, passado o choque inicial, ela quer ter esse momento. E nem sempre temos um espaço adequado para isso.”
Atendida pelo ambulatório, a conselheira tutelar Elem Andrade, de 45 anos, relatou: “Sou muito grata à toda a equipe pela melhora que tive, porque naquele primeiro momento você está no fundo de um poço. Então, com a fala, aconselhamento e apoio deles, você começa a enxergar o mundo de uma outra forma. Hoje eu tenho mais sentimento e amor ao próximo”.
Segundo Maria Marta, “muitas vezes, essas mulheres escutam frases como ‘daqui a pouco você engravida de novo’, como se um filho substituísse o outro, mas não substitui”. E completou: “Quando a gente perde o marido, vira viúva. Quando perde os pais, vira órfão. Mas não existe um nome para quem perde um filho. Porque é o inverso da ordem natural da vida”.
Julenir dos Santos, de 39 anos, moradora de Planaltina (DF), frequenta o ambulatório há seis meses, após sua quarta perda gestacional. Ela afirmou que a mudança na legislação a fez sentir sua dor reconhecida. “Na minha última perda, eu estava com cinco meses. Já tinha nome para ela, mas na certidão não constava. Agora, com essa mudança, outras mães poderão dar nome à história delas”.
Fonte: Agora RN